Meu crime

Qual foi o crime que cometi ao mudar de ideia? Qual a lei eu burlei ao fazer diferente do que tenho costume? Saí da rotina, essa foi minha violação? Fugi do habitual, isso foi ilícito?

O que você esperava? Que eu me mantivesse sempre sendo a mesma? Você queria realmente que eu não conhecesse o novo, outro lado, outro jeito? Era pra me manter previsível, uma caixinha de círculos e monotonia?

Você me colocava na parede com seus argumentos de que eu estava ficando velha sem viver a vida. Você me encurralava com suas perguntas e posições, jogando luz no que eu escondia. Você descobriu o que eu queria e que nem mesmo eu sabia. Você me motivou, me abriu os olhos para ver além das minhas dependências, respostas e ações viciadas. Você me criminalizou, me marginalizou, me tirou do centro das minhas seguranças e confortos. Me levou pro desconhecido, um matagal de maravilhas e perigos, e lá você me deixou, me abandonou alegando precisar dali seguir sozinho. Não me deu prazo algum para correr atrás de abrigo, me deixou com sede, carências, frio.

Não me queixo por sua partida. Ainda não voltei pra casa, ainda não acertei o rumo. Até poderia voltar por onde eu vim, mas você quer mesmo que eu volte? Quer que eu volte para onde você me abandonou? Você não viu motivos que te fizessem ficar. Não entendo suas alegações por eu não ter me mantido naquela condição.

O que você queria eu cometi: me permiti experimentar. E descobri que algumas coisas tem gostos muito ruins. Quase me envenenei com ervas daninhas. Me perdi no delírio do novo, me embriaguei, e fiz o que você fez: me deixei.

E voltei. Não para aquela cela de antiguidades e poeiras, com aquela velha coleção de figurinhas repetidas. Só retornei a mim - recusando o novo que me incriminou, me salvando com as descobertas boas que me livraram. Assumi ações e desmenti falsas denúncias. Quem eu sou testemunhou em meu favor. Mas ainda há uma sentença que estou cumprindo, a mais cruel: Seu julgamento de que minha vida é uma mentira. E por quê mesmo? Por que eu ousei fazer diferente do que o costume me fazia?

Meu delito foi o novo ao qual você me jogou, o silêncio e a incondicional. Mas ainda que você tenha sido meu cúmplice, não te julgo culpado pelos resultados. Cada um pague por seus próprios atos.

Seu carinho poderia ser meu melhor advogado. Seu conhecimento de mim poderia pagar a fiança. Mas o que vivemos foi deturpado, e fizeram das fragilidades provas contra mim.

Minha vida não se falsificou como diz suas delações graves. Diferencie mudanças de mentiras. Separe acertos de escolhas erradas. Aceite minhas testemunhas! Quando conseguir isso, espero que me liberte das suas acusações, da sua indiferença, dessa sentença de morte que é sua desconfiança em mim.

Assinado: Jéssica Flávia Oliveira.
/Fotos de Autores Desconhecidos


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