Além

A música mais bonita que pude ouvir, tocava no andar mais baixo que eu já pude chegar. Longe de qualquer conceito ou conhecimento mainstream, seus acordes intensos transgrediam minhas experiências comuns. A canção mais bonita, sangrou enquanto curava. As vozes que cantavam junto aos acordes, afinadas em silêncio, extraíam a expressão mais pura de sentimentos, ausente dos significados restritos das palavras. Cortou a superficialidade de qualquer pensamento, deixando evidentes minhas raízes.

O despertar do espírito que adormecia, o preenchimento da alma vazia, afago para o corpo exausto. A música mais bonita, era simples, em meio às notas mais complexas, tocou e ainda toca, mesmo sem instrumentos. A música mais bonita era minha, era eu. No andar mais baixo, deixei tocar cada necessidade e vibração que tinha. E essa mesma música, toca diferente para cada um. O que eu ouvi, o que eu senti, era eu. A interpretação estava a minha deriva. Nem que eu emprestasse aquela música, de nada adiantaria. A música mais bonita, se mistura em várias outras, mas se distingue de todas. A sensibilidade aflorando na pele, entregue aos estímulos mais variados - emigrantes de dentro para fora, visitantes passeando de fora para dentro.

Ouvidos sempre atentos e uma mente aberta, pois a canção mais bonita pode não tocar nos momentos certos, e nem nas esperas. Pode até ser perdida, ou passar sem que seja realmente ouvida. Talvez toque apenas uma vez, e nunca mais se repita. A canção mais bonita, toca, em breves instantes em que viver foge as margens do que pode ser definido, e mergulha mar adentro. Nos abstrai das multidões para horizontes privados de ocupação. O toque que nos coloca em contato com nossa efêmera significância, limitado conhecimento, e frágil capacidade de apreciar.

O toque, a música, a beleza da contemplação, além.


Assinado: Jéssica Flávia Oliveira.
/Imagens de Autores Desconhecidos
/Gif de Jean Francois Painchaud

    

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